Não sou mestre de culinária nem sei enfeitar a travessa,
apenas ando de olho na ementa dos cozinheiros da nação, para não comer gato por
lebre acompanhado da sobremesa que diariamente é propagada pela comunicação
anti-social ao serviço do dono, magistralmente pintada no quadro de Paula rego,
“Salazar a vomitar a Pátria”.
A ousadia de citar a artista e sua colorida obra, num quadro
tão negro e deprimente como o que vivemos, obriga-me a pedir desculpa pela
ignorância de quem não sabe distinguir o mural “Guernica” de um anjo Gabriel
pintado na tabuleta de uma campa do cemitério paroquial, porem foi a melhor
descrição que encontrei para descrever o prato que ainda continuamos a consumir
com prazo de validade avariado.
Muitos parasitas da culinária informativa, politica e financeira,
formam um triângulo que nunca se movimenta por impulsos de liberdade, igualdade
e fraternidade. De vez enquanto descem ao rés-do-chão, com o objetivo de manter
o povo desunido que mais facilmente será vencido, criando intrigas entre pais e
filhos, avós e netos, maridos e esposas, funcionários públicos e privados,
aplicando a tradicional cartilha de dividir para melhor reinar, aumentando assim
o pelotão dos dependentes do rendimento de dignidade mínima, e reforçando o batalhão
do rendimento eleitoral máximo, transformando a nossa sopa dos pobres imprópria
para consumo humano.
Há tempos atrás, no turno diurno à luz do dia, o (PS) “Piquete de
Salvação” aterrou aflito com notável falta de ar em socorro do (BCP) “Bom Comércio
Partidário”, disponibilizando para a intervenção o trio “Ferreira, Vara e Amado”,
(FVA) “Fraco Valor Acrescentado” assim denominados depois de concluída a operação.
Agora no turno noturno pela calada da noite à luz da EDP, com idêntica prontidão
e igual aflição respiratória, aterrou o (PSD) “Piquete de Salvação Destemida”,
em socorro da (sagrada) família (BES) “Benemérita Esperança Sagrada”
disponibilizando para a operação a brigada de serviço (BRM) “Bento, Rato e Mota”.
Mota, destacado quadro ativo do piquete de intervenção, e
ilustre deputado da nação com responsabilidades nos serviços de informação do
estado, foi sacrificado com o cargo de Presidente do Conselho Estratégico e “Chairman”,
um género de sentinela da caserna para vigiar o paiol das munições.
Rato, que ainda hoje não sabemos por qual buraco terá
entrado, depois de uns tempos a estagiar no ministério das finanças a roer a dívida
pública que vem-Deu ao novo patrão, para na melhor ocasião devolver às origens
com juros e língua de três palmos.
Bento, ilustríssimo economista e conselheiro de estado,
amigo do amigo Cavaco e reserva especial de Coelho, previamente engarrafada
para servir nestas grandes ocasiões depois de esgotado o meio-seco Gaspar e a
seca Maria Albuquerque. Enfim, tudo gente refinada da alta finança, selecionada
(nos viveiros geniais) entre dez milhões de almas ingénuas, e orgulhosas de
mais uma peregrinação ao campo santo onde jaz o (BPN), “Bom Povo Nacional” para
rezar-lhe pela alma.
Sabemos o sofrimento que passam estes génios (da manigância),
para conseguir a chuva no naval e o lugar ao sol na eira o ano todo. Esta malta,
quando termina a licenciatura (de
preferência ao domingo pela fresquinha) e se apresenta ao mercado de
trabalho é escorraçada pelas empresas em geral, restando-lhe apenas a via única
do funil para ingressar no penoso caminho do caciquismo paroquial, distrital e nacional,
antes de conseguir alcançar a tão desejada selva povoada de “Boys e Vacas”, para
aprender o equilíbrio de manter-se encima da árvore com a técnica do macaco que
só larga o ramo da mão esquerda quando o da mão direita estiver bem agarrado.
Depois de conseguida a lição de equilíbrio na lei da selva, os recém-licenciados
“dominicais”, tem agora tacho
garantido na pantanosa selva do povo.
Tudo que vemos, lemos e ouvimos na comunicação anti-social
está ao serviço desta cacicada, dos bancos e demais grupos económicos, para
intimidar-nos, incriminar-nos e relegar-nos à prateleira da inexistência,
criando um ruido de superfície que abafa os verdadeiros problemas de fundo onde
vivemos espezinhados, enxovalhados e ainda culpados pela falta de emprego, de salário,
e pela desgraça que o país atravessa, acusados de gastar mais de que devemos, e
de viver acima das nossas possibilidades, porque fomos ao Jumbo comprar um sofá
e um chapéu de palha mexicano na ultima excursão paroquial a Fátima.
É claro que com estes vícios despesistas, resta-nos emigrar
para evitar a penhora do sombrero, do sofá e da casota do boby, fiel
companheiro que vai compartilhar a nossa próxima morada debaixo da ponte, longe
do conforto do monarca D. Duarte Pio reformado desde o dia em que nasceu, tal
como tantos Republicanos que também o são desde o dia que tomaram assento nas
cadeiras da assembleia do povo, para servir de cães-de-guarda dos pobrezinhos
que de vez enquanto por amnesia aguda, se esquecem em declarar cinco milhões de
euros ao IRS.
No célebre quadro pintado a cores, “Salazar vomita a Pátria”, no quadro
pintado a preto e branco em que vivemos, ainda permanecem as regurgitações de
uma pátria Salazarenta, que tal como na altura ainda me obriga a ver e ouvir
sempre a mesma porcaria, com notícias e comentários por encomenda, seguidos de
entretenimentos primários, enjoativos e fastidiosos de uma culinária mediática que
aplica a receita forçada do come-em-casa, enchidos e entalados, entradas e
sobremesas, com shows de sanita e concursos de bidé para enfeitar a mesa e
disfarçar o sabor do prato único do dia e da noite.
Finalmente de quem é a culpa? Se analisarmos a coisa desapaixonadamente
devemos reconhecer que a culpa é nossa. Chegamos a um tal ponto de decomposição
cívica, que só encontraremos comparação em Vítor Frankenstein a criar monstros
que não sabemos controlar.
Foi apenas um sonho. Uma noite de inverno sonhei que o povo me tinha
confiado a guarda dos governantes. Aquilo era uma espécie de governantes com comportamento
de um rebanho de cabras soltas no meio de um campo de vinha totalmente
destruída.
“Passado alguns dias
continuavam a abrir a boca com a mesma facilidade, mas era notório a melhoria e
o cuidado com que a fechavam para não trincar a língua. Os governantes que
tinham sido eleitos para governar e tentassem servir-se do povo como escadote
para saltar para o lado da vida airosa, só tinham duas saídas: voltar para a
casa de onde vinham ou passar pela casa do endireita para concertar a meia
dúzia de costelas partidas, que era a taxa mínima garantida que se aplicava aos
oportunistas e aos aldrabões. Passado um mês a fila de candidatos desapareceu e
ninguém queria ser governante, foi necessário decretar (como na tropa) a governação
obrigatória onde o recruta-governante tinha de respeitar as tropas e governar a
caserna com exemplar dignidade. O tempo passava ao ritmo que o país melhorava.
Havia lugar para todos. O dinheiro sobrava, não havia desempregados, esfomeados,
maltratados, abandonados, espezinhados, enteados nem aldrabões excomungados.
Apenas havia filhos de quem a pátria se orgulhava, protegia e respeitava. As
cabras da vinha transformaram-se em governantes, e a vinha das cabras num país
de sonho”.
Abri os olhos,
queria voltar a sonhar mas continuei no pesadelo. O país de sonho continua a vinha
das cabras, os governantes continuam as cabras da vinha, e o povo continua sem
uvas e a beber vinho feito a martelo.